Por Claudio Farias
Nesta semana, o Google começou a mandar para seus
anunciantes um e-mail bem alarmista: se o PL 2630, conhecido como PL das Fake
News, for aprovado, "milhares de pequenas e médias empresas no Brasil –
muitas delas ainda se recuperando da crise causada pela pandemia – terão
dificuldades em aumentar suas vendas com a ajuda da publicidade on-line",
diz o texto.
O PL das Fake News tem uma série de artigos controversos,
mas é o mais próximo que estamos de alguma regulação do tema. As plataformas
focam na oposição a três pontos principais: questões de transparência e modelos
de moderação de conteúdo, a proposta de remunerar conteúdos jornalísticos e a
de regulamentar a publicidade digital. É esse último o foco da ofensiva mais
agressiva contra o PL.
O e-mail aos anunciantes foi o último passo da investida do
Google, em conjunto com a Meta – novo nome do Facebook –, o Twitter e outras
empresas do ramo contra o projeto de lei, que está para ser votado na Câmara. A
campanha das big techs contra o PL já teve anúncio de página inteira em jornal,
chamada na página inicial de buscas do Google e propaganda em aeroporto. O tom
é sempre alarmista: dizem que o projeto de lei compromete a internet livre,
desestimula as plataformas a combaterem desinformação e coloca em risco os
"milhares de pequenos comércios" que dependem de anúncios para
sobreviver.
É uma estratégia clássica de lobby estressar consequências
hipotéticas ou mesmo sem embasamento para movimentar a opinião pública. Foi
assim com a discussão sobre o veto ao Marco Temporal e com a liberação das
patentes da vacina: a indústria dizia que o primeiro colocaria em risco a
produção de alimentos no Brasil; a segunda, que acabaria com a inovação. Agora,
no caso do PL das Fake News, o discurso é que ele vai "acabar com a
publicidade digital" e prejudicar os comerciantes.
É uma manobra argumentativa genial, convenhamos: de fato,
milhares e milhares de pequenos comerciantes usam os anúncios direcionados para
impulsionar seus negócios. É em cima deles que as big techs estão fazendo
pressão. A proposta do PL relatado por Orlando Silva, do PCdoB paulista,
restringe, por exemplo, o uso de dados pessoais fornecidos pelos usuários às
empresas por terceiros e obriga as empresas a identificarem conteúdos
impulsionados e publicitários.
Na proposta, elas também devem identificar o histórico de
conteúdos impulsionados com que as contas tiveram contato nos últimos seis
meses, com detalhes sobre os critérios de perfilamento. Você foi impactado por
um anúncio de fralda? As empresas deveriam, segundo a proposta, explicar o
porquê. E também deveriam ser transparentes sobre a identificação dos
anunciantes e dados gastos com publicidade. Mas elas, aparentemente, acham que
não podemos saber as razões pelas quais nos consideram consumidores para
determinados tipos de produtos.
O IAB, entidade que representa o setor de publicidade
online, criou até um abaixo-assinado contra as propostas. "Sem a
publicidade digital, a economia brasileira perderia R$ 23 bilhões por
ano", diz o instituto. A entidade tem como filiados Google, Meta, Globo,
UOL, R7, Spotify, Mercado Livre e até o Taboola, aquele fornecedor de anúncios
picaretas disfarçados de notícias jornalísticas.
A Meta argumenta que o artigo em questão foi inserido sem
debate e que não "versa sobre desinformação". Bem, basta uma passeada
em qualquer pé de notícias abastecido com Outbrain ou Taboola para ver que
pérolas como "Eliana tira a maquiagem e nos deixa de boca aberta" ou
"Novo método para tratar fungos nas unhas vira febre em São Paulo" –
títulos sensacionalistas que levam a textos duvidosos, cujo único propósito é
faturar com publicidade – dividem espaço com notícias reais, confundindo o
leitor. Se isso não é desinformação, eu não sei bem o que é.
Folha, Globo, Metrópoles e IstoÉ estão entre os veículos que
cederam espaço para faturar com esse tipo de anúncio. O PL é a iniciativa de
regulamentação mais próxima do que temos para regular esse tipo de publicidade
invasiva e desinformativa, mas as empresas de tecnologia não parecem ter
interesse em mexer nos seus negócios.
"As big techs não estão preocupadas com os ganhos da lanchonete do
seu bairro, mas sim com o próprio modelo de negócios que as sustenta",
resumiram as jornalistas Vivane Tavares e Iara Moura, da ONG Intervozes, que
defende liberdade de imprensa e direitos digitais.
Muitos pesquisadores argumentam que o capitalismo de
vigilância, que usa a coleta massiva de dados para ter um conhecimento profundo
das pessoas, e, assim, fornecer anúncios direcionados profundamente
persuasivos, é uma das razões da epidemia de fake news e caos no ambiente
informacional que vivemos. A reação histérica das empresas mostra que a
proposta do PL, apesar de ambiciosa, atingiu em cheio o coração desse problema.
Com informações Tatiana Dias
/ Intercept Brasil
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João Rangel, Recife-PE